sexta-feira, 27 de março de 2015

Alegoria da caverna

A minha sombra sou eu,
ela não me segue,
eu estou na minha sombra
e não vou em mim.
Sombra de mim que recebo a luz,
sombra atrelada ao que nasci,
distância imutável da minha sombra a mim,
toco-me e não me atinjo,
só sei do que seria
se de minha sombra chegasse a mim.
Passa-se tudo em seguir-me,
e finjo que sou eu que sigo,
finjo que sou eu que vou,
e não que me persigo.
Faço por confundir a minha sombra comigo:
estou sempre às portas da vida,
sempre lá, sempre às portas de mim.              

José Almada Negreiros "A sombra sou eu"


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