Saía do metro e preparava-me para entrar numa pastelaria, ali na baixa de lisboa, quando fui abordada por duas raparigas que me perguntaram se poderiam fazer um teste. Cansada de dizer não às solicitações com que a cidade diariamente nos confronta, hesitei e perguntei para que servia o dito teste.
Explicaram: pretendia-se verificar o que atraía o nosso olhar dentro da loja. Para tal, teria que colocar uns óculos ligados a um certo aparelho que, por sua vez, registaria o foco da nossa atenção.
- Mas eu só quero um pão de deus, já escolhido da montra, argumentei.
Pacientemente informaram-me (?) que o importante era saber quais os nossos chamamentos mais íntimos, aqueles que nos desviavam do objetivo, aqueles para os quais a nossa vista correria independentemente da nossa vontade ou decisão tomada.
Aceitei o teste e sujeite-me a que me colocassem os óculos. Mau grado a minha boa vontade e já uma certa curiosidade pelo jogo, depois de duas tentativas, deram por finda a experiência, dizendo-se incapazes de utilizar o aparelho.
Eu já calculava que a coisa não iria correr bem... imagine-se que haveria hipótese de sabermos o que, na verdade, nos faz correr, o que nos move, nos leva a sair do conforto do casulo onde nos abrigamos, os mil gestos descodificados da sua aparente simplicidade…
Lembrei a João que me dizia ser possível conhecer melhor o outro, caso soubéssemos ver para além do visível, perceber o que lhe retira o sono ou o retira do sono, compreender o que o entusiasma, o que o faz agir …
Entrei na pastelaria e tentei comprar o pão de deus sem olhar para mais nada.