Há demasiado sofrimento neste planeta. Tão estupidamente avassalador, que julgo vir a gerar limites bloqueadores das emoções. Creio que, nesta fase, o corpo começa a pensar com o estômago, com o frio, com o dedo do pé ...ou com a indiferença total de querer morrer para salvar o outro.
Penso nas histórias de horror que a televisão mostra entre duas partidas de futebol. Vejo, então, estarmos tão anestesiados que não sabemos mais chorar. Somos uma nova espécie de medusas gelatinosas, não damos à praia mas já estamos mortos.
Ultimamente sonho também que morro. E todas as noites retiro mais algum tempo à vida. Faço cálculos: meses, alguns anos (os últimos passaram tão depressa! durmo? estou acordada?) e um poço negro, pesado, vazio, aloja-se-me no peito e angustia-me.
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Sou pequenina neste sonho, é inverno e procuro imaginar a primavera para forçar a lágrima. Recusa-se, então busco a memória da minha avó Hermínia, as maçãs sumarentas do poço, o rasto tão fantasioso dos sonhos da adolescência, as cartas trocadas e o tempo ingénuo das margaridas. Não crio, não projecto, aguardo...
Estou perto do choro, mas ainda não sou capaz!